terça-feira, 25 de agosto de 2009

A onomatopéia na poesia

Ainda me lembro dos exemplos da professora (ensino fundamental) quando o assunto era onomatopéia.

Au-au, do cachorro.
Miau, do gato
fom-fom, da buzina... e por aí continuavam.

Coisa boba isso, né?

Mas dia desses, lendo o prefácio do livro "Desenhos mínimos de rios", do poeta joinvilense Fernando José Karl, reparei no quanto o recurso onomatopéia pode ser bem mais rico, especialmente para a poesia.

Aí vc se pergunta: só agora vc descobriu isso? pois é, só agora reparei.
O exemplo é retirado do prefácio do livro de Karl, escrito pelo também poeta Carlos Nejar:

OBSERVANDO UM SINO EM OSAKA

Sino de pedra
e nenhum pássaro
no sino de pedra.

Trinta anos o sino no pórtico do templo.

Um monge lava o sino de pedra,
depois lava-se observando o sino,
depois dança em torno do sino

e faz de suas mãos
pássaros

que pousam no sino de pedra.

Sino de pedra
e alguns pássaros
no sino de pedra.

Nesse exemplo, A repetição de "sino de pedra" marca o ritmo de um sino a bater, como bem observa Nejar. Essa onomatopéia é bem mais ampla do que as comuns, pois é realizada ao longo de todo o poema. Além disso, ela não é uma simples imitação de um som: Karl aproprio-se estritamento da ideia de "ritmo", sem se preocupar com o "som" de um sino. O resultado é essa composição excelente que vemos aí acima.
Outro exemplo diferente e muito legal de onomatopéia para sinos é esse pequeno poema de Oswald de Andrade, extraído do livro "Pau-Brasil":

BONDE

O transatlântico mesclado
Dlendlena e esguicha luz
Postretutas e famias sacolejam

Aqui, Oswald brinca com a tradicional imitação do som de sinos.(lembrando que os bondes possuem sinos acoplados em sua estrutura para anunciar sua passagem) Mas o criativo Oswald não isola a reprodução do som (dlen-dlen), ao invés disso, cria uma palavra (dlendlena) a partir da onomatopéia. Demais!
(Particularmente, acho esse poema maravilhoso. Com três linhas, Oswald apresenta um punhado de ideias e imagens)

Enfim, olhando para esses exemplos de uso inteligente da onomatopéia, reforçou-se a ideia de que todo recurso (seja ele linguístico, temático, estilístico, etc) pode ser usado com criatividade, desde que se faça um uso inteligente deles. Não há recursos gastos: o que há são autores gastos, que não ousam e ficam a repetir velhos modelos do bi-bi fom-fom.

:P

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